Resumo Executivo – MP n° 1152 de 2022
Autor: Presidência da República | Apresentação: 29/12/2022 |
Ementa: Altera a legislação do Imposto sobre a Renda das Pessoa Jurídicas – IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL para dispor sobre as regras de preços de transferência.
Orientação da FPA: Favorável com ressalvas
Situação Atual
- Último estado
- MATÉRIA DESPACHADA
- Prazos abertos
- 02/02/2023 – 02/04/2023: Deliberação da Medida Provisória (Art. 10 da Res. 1/2002-CN combinado com o art. 62 da CF)
- Regime de Urgência
- 19/03/2023 em diante (Art. 9º da Res. 1/2002-CN combinado com o art. 62 da CF)
Principais pontos
A Medida Provisória nº 1.152, de 28 de dezembro de 2022 objetiva alterar a legislação do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), para introduzir novo marco legal atinente à matéria de preços de transferência, no Brasil.
Mas o que é preço de transferência?
O preço de transferência (ou transfer Pricing) é utilizado para identificar os controles a que estão sujeitas as operações comerciais ou financeiras realizadas entre partes relacionadas, sediadas em diferentes jurisdições tributárias, ou quando uma das partes está sediada em paraíso fiscal.
Em razão das circunstâncias peculiares existentes nas operações realizadas entre essas pessoas, o preço praticado nessas operações pode ser artificialmente estipulado e, consequentemente, divergir do preço de mercado negociado por empresas independentes, em condições análogas – preço com base no princípio arm’s length”.
No Brasil, as transações que estão sujeitas as regras de preços de transferência são as seguintes:
- Importação de Bens, Serviços e Direitos;
- Exportação de Bens, Serviços e Direitos;
- Juros pagos ou creditados em operações financeiras;
- Juros auferidos em operações financeiras;
- Transações Back to Back
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As modificações na legislação tributária apresentadas pela MP 1152/2022 aplicam-se na determinação da base de cálculo do IRPJ e da CSLL das pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil que realizem transações controladas com partes relacionadas no exterior.
A iniciativa decorre da constatação de lacunas e fragilidades existentes no atual sistema e de problemas decorrentes do seu desalinhamento e das interações com o padrão estabelecido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que prejudicam o ambiente de negócios, a inserção do País nas cadeias globais de valor, a segurança jurídica e a arrecadação de receitas tributárias.
Em síntese, mencionadas distorções trariam diversos prejuízos ao país, tais como:
(i) riscos de erosão da base tributária e transferência de lucros para outras jurisdições, em detrimento da arrecadação tributária;
(ii) ambiente desigual entre contribuintes, em desfavor da competitividade;
(iii) possibilidade de dupla tributação para diversas empresas, que acabariam evitando o Brasil como destino de investimentos, entre outras mazelas.
A proposta foi desenvolvida buscando alinhar o sistema brasileiro de preços de transferência ao padrão OCDE e garantir o alcance do duplo objetivo das regras de preços de transferência, isto é, o de assegurar que uma base tributária apropriada seja alocada no Brasil e de se evitar a dupla tributação. Tal alinhamento, aliás, é tido como passo fundamental no contexto das discussões da acessão do Brasil à OCDE.
Impactos e Posicionamento do Setor
Para o setor agropecuário, o preço de transferência é um assunto muito importante, visto que diversas empresas que investem na agropecuária brasileira, possuem atividades que se utilizam de transferências entre partes relacionadas, e por esse motivo estão sujeitas às regras de Transfer Pricing.
No entanto, algumas questões (abordadas ou não) devem ser objeto de aperfeiçoamento, sob pena de se criar um ambiente desfavorável aos negócios, e por consequência, prejudicial a um setor tão pujante e dinâmico da economia, como é o Agro brasileiro.
São nossas ressalvas:
Vigência: o prazo estabelecido para implementação obrigatória (1 ano) é muito curto. Muitos detalhes serão esclarecidos via Instrução Normativa, que ainda não foi editada e deveria ser discutida de forma colaborativa, o que leva tempo (segure-se que o prazo mínimo seja a partir de 2026)
Caracterização de Paraíso Fiscal (ou Regime Fiscal Privilegiado): pela MP estarão enquadrados nessa condição, jurisdições que tributem a renda a uma alíquota inferior a 17%, quando a própria OCDE considera como tributação mínima 15% (Pilar 2 – OCDE)
Não dedutibilidade dos royalties pagos a residentes domiciliados em Paraíso Fiscal: Entendemos que propor a indedutibilidade dos pagamentos de royalties, sem uma análise da substância da operação é extremamente rigorosa e despropositada. A aplicação do princípio arm´s length visa exatamente evitar erosão de base e transferência de lucros, através da exigência de que transações controladas estejam alinhadas com o comportamento de mercado (adequação: supressão do art. 45 da MP).
Regra Transitória: devido ao alto grau de complexidade, nossa sugestão seria de manter pelo menos 3 anos de vigência das 2 regras em paralelo, para que os contribuintes pudessem ter tempo hábil para realizar todas as adequações internas.
Ausência de regra de transição para contratos já firmados: caso haja a alteração do prazo de implementação para 2026, o ponto estaria atendido.
Conceito de Vínculo: a MP estendeu o conceito de vínculo para qualquer parte que exerça influência. Esse conceito abre margem para diversas outras interpretações e diverge do conceito de parte relacionada demonstrado nos guidelines da OCDE, o qual refere-se à controle comum (adequação: adequação ao conceito modelo da OCDE).
Ajustes negativos: A vedação expressa ao ajuste negativo (redução de base ou aumento de prejuízo). Vedar o ajuste negativo neste caso pode gerar bitributação. alternativamente, poderia haver requisitos para comprovação do ajuste negativo, porém, simplesmente vedar não é a solução correta (Adequação: manter a possibilidade, com o intuito de ajustar os resultados corretamente).
Ajustes Secundários: o ajuste secundário é equiparado a um empréstimo presumido com juros prefixados à taxa de 12% ao ano, o que contraria a própria lógica do princípio arm’s length. Países como Japão, Austrália, Reino Unido, não adotam essa prática (Adequação: eliminação do ajuste secundário prevista nos artigos 17, inciso IV, e artigo 19.
Conceito de serviço: é importante deixar claro (no texto legal) que o conceito é aplicável apenas para efeito do preço de transferência (Adequação: estabelecer clareza no texto).
Ajuste Compensatório: a MP define que os ajustes compensatórios devem ser realizados dentro do ano calendário. No entanto, para os casos em que existem diferenças entre IFRS e Local Gaap, muitas vezes o balanço final das empresas no exterior é finalizado meses após o encerramento do ano (estabelecer possibilidade de ajuste compensatório em data posterior
Comparáveis Externos: tendo em vista a dificuldade de buscar comparáveis internos, ainda mais em relação à multinacionais Brasileiras, nossa sugestão seria que a RFB permitisse a busca de comparáveis externos na realização dos estudos.
Critério de seleção de parte testada (Art. 15): a MP estabelece método complexo e subjetivo, enquanto a OCDE fala em parte “menos complexa” (Adequação: modelo da OCDE).
Comando taxativo (e não autorizativo) para retificação (art. 37): A MP prevê que a “caso a autoridade fiscal discorde, durante o procedimento fiscal, da determinação da base de cálculo do IRPJ e da CSLL efetuada pela pessoa jurídica na forma prevista nesta Medida Provisória, o sujeito passivo poderá ser autorizado a retificar a declaração ou a escrituração fiscal exclusivamente em relação aos ajustes de preços de transferência para a sua regularização”, de forma discricionária (Adequação: eliminar “ser autorizado a”, mantendo “poderá retificar”).
Guidelines da OCDE como fonte para dirimir dúvidas: é importante constar na lei que os regras da OCDE poderão ser utilizados como fonte para dirimir dúvidas. Esse ponto solucionaria questões ao longo da MP que podem afastar as regras brasileiras da OCDE.
Regulamentação participativa, justa e simplificada: necessidade de buscar um compromisso da Receita Federal em compartilhar e construir o texto da Instrução Normativa juntamente com o setor produtivo, de modo a garantir a utilização de metodologias simplificadas para a aplicação dos Preços de Transferência, dada a Subjetividade e Complexidade do tema.
Taxa por Consulta para validação de metodologia: Pela MP, será cobrada a taxa de R$ 80 mil reais por consulta de Contribuintes que objetivem validar a sua metodologia de preço de transferência junto a Receita Federal (Adequação: suprimir o §8º, do art. 39).
Prozo máximo para resposta de consulta: falta dispositivo que estabeleça um prazo máximo para que as Autoridades Fiscais emitam resposta à consulta (p.ex. 6 meses).
Método PIC para determinar o valor da commodity: Entendemos que seria recomendável a exclusão do caput do artigo 13, retirando do texto legal a escolha preferencial do método PIC nas operações com “Commodities”. Essa referência é importante, na medida em que a indicação preferencial de uma metodologia é contraditória com o princípio arm’s length e tende a gerar mais litigiosidade.
Operações de dívida: Os artigos 28 a 30 procuram delimitar as operações de dívida entre as empresas controladas, se distanciando do tema relativo a Preços de Transferência; e criando norma de não dedutibilidade de “juros e outras despesas” relativos a estas operações, para fins de IRPJ e da CSLL. Assim, a sugestão seria excluir os dispositivos; ou ao menos o Parágrafo Único do artigo 28.
Ajustes à base de cálculo: Os artigos 17 a 19 tratam das regras decorrentes dos ajustes de base de cálculo, permitindo que o Contribuinte ou o Fisco, façam estes ajustes quando identificarem diferenças nas bases de comparação. Contudo, somente é permitido este ajuste, quando implicar em maior tributação. Assim, se faz necessária a devida equivalência e equilíbrio no resultado de qualquer ajuste que se faça, ou seja, permitir “adição” e também a “subtração” da base de cálculo dos tributos, quando realizados ajustes decorrentes dos termos e das condições da transação controlada. Assim, sugere-se alteração no artigo 17 e § 4º, do artigo 18:
Delineamento da transação controlada: Os artigos 7º, §§ 1º e 3ª, e artigo 8º são muito genéricos e permitem de forma praticamente irrestrita a desconsideração das operações pelas autoridades fiscais. Assim, seria importante:
- A inclusão de dispositivo específico limitando a utilização das chamadas “opções realisticamente disponíveis” (artigo 7º, § 1º);
- Conceituação do termo “opções realisticamente disponíveis” (artigo 7º, § 1º);
- Incluir referência expressa às atividades comerciais, industriais e de prestação de serviços, e sua interconexão, para fins de determinação dos riscos economicamente significativos (artigo 7º, § 3º);
- Criação de regra com limites objetivos para a desconsideração / substituição da transação controlada por transação alternativa, bem como os critérios para a determinação da transação alternativa (artigo 8º);
Ajuste Secundário: Seria importante a revogação da regra de ajuste secundário prevista nos artigos 17, inciso IV, e artigo 19. Observa-se que o ajuste secundário é equiparado a um empréstimo presumido com juros prefixados à taxa de 12% ao ano, o que contraria a própria lógica do princípio arm’s length.” O ajuste secundário, apesar de ser uma recomendação da OCDE, é um tema bastante controverso. Isso porque, há grandes economias mundiais (portanto, grandes players no comercio internacional) que não adotam esta regra. As principais economias que não adotam o ajuste secundário são China, Reino Unido, Japão e Austrália. O ajuste pode representar um risco de dupla tributação. Isso acontece pois na essência o ajuste secundário significa a recaracterização da operação originalmente geradora do ajuste primário ou espontâneo. Desta forma, caso uma das jurisdições envolvidas discorde da recaracterização, uma dupla tributação pode acontecer.
Regra Brasileira de Tributação em Bases Universais (TBU): O tema é fundamental, posto que se não for endereçado causará um grave risco de dupla tributação dos lucros das subsidiárias do exterior, por conta da regra Brasileira de Tributação em Bases Universais (TBU). Sugere-se o aprimoramento dos mecanismos que já existe hoje na Lei 12.973, bem como, o que existe na MP 1.152/2022.
Fonte de Interpretação: propõe-se que seja considerada como uma fonte valide de interpretação para o disposto na MP 1.152/22 os Guidelines da OCDE. Isso seria muito interessante, tendo em vista o grande grau de subjetividade da regra internacional e o fato de que os guidelines apresentam extensas explicações e exemplos sobre a norma.
Royalties: sugere-se retirar o dispositivo que impede a dedutibilidade de despesas de royalties quando pagas para paraísos fiscais. Esta regra é ruim, uma vez que ela distorce a aplicação do princípio arm´s length.
Definição de Partes Relacionadas: sugere-se excluir o termo “conselheiro” na definição de partes relacionadas. Este termo cria uma extrapolação do conceito muito abrangente e desnecessária.
São essas nossas ressalvas.