Resumo Executivo – Despacho nº 4.410 de 2020
Orientação da FPA: Favorável ao despacho
Principais pontos
- Dispõe que o regime de uso consolidado das Áreas de Preservação Permanente (APP) instituído pelo Código Florestal de 2012 (Lei 12.651/12) incide sobre o Bioma Mata Atlântica.
- Ou seja, o Código Florestal também se aplica ao bioma Mata Atlântica.
- O uso consolidado de APP está previsto nos artigos 61-A e 61-B da Lei 12.651/12. Estes artigos autorizam a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural (assim como das residências e da infraestrutura associada a tais atividades) em Áreas de Preservação Permanente rurais, consolidadas até 22 de julho de 2008, mediante a recomposição de apenas uma parte da APP ocupada, em extensão menor do que a extensão normal da APP estabelecida no art. 4º do Código Florestal.
Justificativa
- A lei da Mata Atlântica determina explicitamente a especial aplicação do Código Florestal ao Bioma Mata Atlântica (art. 1º da Lei nº 11.428, de 2006).
- O Supremo Tribunal Federal já consolidou, em caráter vinculante, a constitucionalidade dos arts. 61-A e 61-B do Código Florestal, assentando que tais disposições transitórias não representam retrocesso à preservação ambiental, diante dos demais valores jurídicos igualmente protegidos pela CRFB/88.
- O Código Florestal é lei mais recente, de 2012, e suas disposições não são incompatíveis com a Lei da Mata Atlântica, mas sim complementares: A lei da Mata Atlântica, por exemplo, não regula os regimes de APP, de Reserva Legal ou de Áreas de Uso Restrito.
- A lei da MA fala que “Somente os remanescentes de vegetação nativa no estágio primário e nos estágios secundário inicial, médio e avançado de regeneração na área de abrangência definida no caput deste artigo terão seu uso e conservação regulados por esta Lei”, ou seja, áreas consolidadas sequer deveriam ser abarcadas pela lei.
- O posicionamento do Despacho novo já era adotado até 2017, quando o Min. Sarney revogou a aprovação do Despacho n° 1050/2015/CONJUR/MMA/CGU/AGU/jmloa, através do Despacho N° 64773/2017-MMA.
- O argumento do Despacho do Min. Sarney era de que os arts. 61-A e 61-B eram prejudiciais ao meio ambiente e inconstitucionais, mas isso se perdeu pelo julgamento do CFLO, então não faz sentido adotá-lo novamente.
EFEITOS PRÁTICOS
- Pequenos produtores serão multados e embargados por estarem cultivando em áreas consolidadas até 2008. Se essa consolidação for revertida, eles perderão suas atividades e até suas casas que foram edificadas nos biomas abarcados pela lei da MA (Mata de Araucárias; manguezais, restingas, campos de altitude, brejos, etc.).
- Desocupação e destruição das atividades agropecuárias, em milhões de hectares, em 15 Estados da Federação (Espírito Santo, Rio de Janeiro e Santa Catarina, e parte de Alagoas, Bahia, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, São Paulo e Sergipe), além de atingir residências, benfeitorias, agroindústrias e tudo o que houver em áreas de preservação permanente. É possível prever, ainda, a aplicação de autos de infração, com multas no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por hectare, além de Ações Civis Públicas.
- Os prejuízos econômicos e sociais da implementação dessas medidas são incalculáveis.
- A reversão do Despacho implicará na retirada de “83 a 159,3 milhões de hectares, sendo aproximadamente 30 milhões de hectares em culturas localizadas em APPs, as quais foram consolidadas, desde que abertas antes de julho de 2008. ”
- O caso do café, que 70% é cultivado em encostas, é emblemático, pois inviabilizaria a produção em Minas Gerais, Espírito Santo e São Paulo. Em 2016, as exportações de café representaram uma receita cambial de US$ 5.35 bilhões de dólares.
- O mesmo se aplica para a uva, no Rio Grande do Sul, que também é cultivada em declive. A maçã, em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, que no mundo inteiro é cultivada em ambiente montano. A criação de aves, suínos e a pecuária leiteira em áreas inclinadas também seria atingida.
- Por fim, a silvicultura, que se concentra em áreas de Mata Atlântica e movimentou em 2015 mais de R$ 68 bilhões, gerando cerca de 530 mil empregos diretos, utilizando uma área de sete milhões de hectares.
MITOS & VERDADES
1) O MMA criou uma nova norma ambiental para a Mata Atlântica que libera o desmatamento nesse bioma.
FALSO
O entendimento apresentado no Despacho 4.410/2020/MMA é o entendimento original do Ministério do Meio Ambiente, esposado desde 2015, quando validado o Despacho 1050/2015/CONJUR/MMA/CGU/AGUjmloa, ao qual foi dado efeito vinculante por meio da aprovação pela Ministra de Estado do Meio Ambiente à época, e que permaneceu até 2017 sem qualquer questionamento. O Despacho 4.410/2020/MMA, portanto, não cria nova norma, mas sim restabelece o entendimento original deste Ministério.
Ademais, esse mesmo Despacho acolhe entendimento jurídico da AGU de que, também no bioma Mata Atlântica, para “áreas consolidadas” (áreas de preservação permanente ocupadas por atividades agrossilvipastoris) até julho de 2008, devem valer os artigos 61-A e 61-B do Código Florestal. O próprio artigo 61-A, §11, define que é “vedada a conversão de novas áreas para uso alternativo do solo nesses locais”, ou seja, define que não pode haver novas supressões de vegetação nessas áreas.
2) O Despacho 4.410/2020/MMA beneficia o agronegócio em detrimento da Mata Atlântica.
FALSO
O Despacho restabelece a aplicação do Código Florestal ao bioma da Mata Atlântica em sua integridade. Esse mesmo Código criou mecanismos econômicos para estimular a recuperação ambiental e o uso sustentável da vegetação nativa, instituindo a possibilidade de comercialização de cotas de reserva ambiental para a vegetação excedente e integrado a outras políticas de restauração ambiental, estimulando o poder público na promoção de assistência técnica e linhas de fomento.
3) O Despacho 4.410/2020/MMA anistia multas já aplicadas pelo Ibama.
FALSO
Os artigos 61-A e 61-B do Código Florestal não afetam as multas anteriores ao Código. As multas anteriores a 2008 são objeto do Programa de Regularização Ambiental (PRA), previsto no artigo 59 do Código Florestal (validado pelo Supremo Tribunal Federal), não sendo objeto do Despacho 4.410/2020/MMA.
4) A Lei da Mata Atlântica protege mais esse bioma do que o Código Florestal.
FALSO
A lei 12.651/12 (Código Florestal) traz estímulos para recuperação de áreas que a Lei da Mata Atlântica não tem. Uma importante inovação trazida pelo Código Florestal é o uso de sistemas agroflorestais para a recuperação de áreas e passivos ambientais. Este mecanismo estimula a produção agropecuária, integrada com a produção de serviços ambientais: o uso de espécies nativas, a proteção do solo, produção de água, refúgio para polinizadores, regulação do clima local, entre muitos outros.
5) O Despacho 4.410/2020 MMA contribui para a criação de segurança jurídica.
VERDADEIRO
O entendimento apresentado no Despacho 4.410/2020/MMA é o entendimento original do Ministério do Meio Ambiente, esposado desde 2015, quando validado o Despacho 1050/2015/CONJUR/MMA/CGU/AGUjmloa. Em 2017, ele foi abruptamente alterado, trazendo insegurança jurídica, já que a Lei da Mata Atlântica, em seu 1º artigo, indica que a conservação, proteção, regeneração e utilização do bioma Mata Atlântica observará também o que estabelece a Lei 4.771/1965 (antigo Código Florestal), hoje substituída pela Lei 12.651/2012 (novo Código Florestal). O Despacho 4.410/2020/MMA, respaldado por parecer da Advocacia Geral da União, restabelece o império da Lei sobre a nota editada pelo Ministério do Meio Ambiente em 2017, retomando o entendimento original deste Ministério e portanto, restituindo a segurança jurídica.
6) Os artigos 61-A e 61-B da Lei 12.651/2012 (Código Florestal) são inconstitucionais, pois anistiam infrações ambientais.
FALSO
O Supremo Tribunal Federal julgou os artigos 61-A e 61-B constitucionais, reconhecendo, inclusive, que estes artigos estabelecem critérios para a recomposição das áreas de preservação permanente. O Despacho 4.410/2020/MMA, portanto, restabelece a constitucionalidade da aplicação do Código Florestal também para a Mata Atlântica.
7) O Despacho 4.410/2020/MMA cria insegurança jurídica aos proprietários rurais e aos órgãos ambientais que administram o PRA.
FALSO
O sistema de Cadastro Ambiental Rural (CAR) foi construído a partir do que dispõe a Lei 12.651/2012 (Código Florestal) para todo o território nacional, inclusive a região de Mata Atlântica, sem que houvesse questionamento específico ao longo do tempo. Assim, para melhor orientar o cidadão e o OEMA que realiza a validação do CAR, deve-se seguir o que dispõe a Lei 12.651/2012 (Código Florestal), identificando as áreas que são passíveis de projeto de recuperação (PRA), ressaltando as regras diferenciadas que estão assegurados na Lei ao pequeno produtor.
8) A Lei da Mata Atlântica (Lei 11.428/2006) e seu Decreto regulamentador no (6.660/2008) não tratam de áreas rurais consolidadas.
VERDADEIRO
A Lei da Mata Atlântica regra a proteção aos remanescentes do bioma. No parágrafo único do artigo 20 da Lei fica claro que somente os remanescentes de vegetação nativa no estágio primário e nos estágios secundário inicial, médio e avançado de regeneração na sua área de abrangência terão seu uso e conservação definidos por essa Lei. Já no art. 10. S 10 do Decreto 6.660/2008 fica claro que áreas já ocupadas com agricultura, pastagens, florestas plantadas ou outras áreas desprovidas de vegetação nativa não sofrem incidência dessa Lei.
9) A Lei da Mata Atlântica e o Código Florestal (Lei 12.651/2012) são leis independentes e não se relacionam em sua aplicação.
FALSO
A Lei da Mata Atlântica e o Código Florestal (Lei 12.651/2012) são leis que se complementam, tanto que já em seu artigo 10, a Lei da Mata Atlântica indica que a conservação, proteção, regeneração e utilização do bioma Mata Atlântica observará também o que estabelece a Lei 4.771/1965 (antigo Código Florestal), hoje substituída pela Lei 12.651/2012 (novo Código Florestal).
10) O Despacho 4.410/2020/MMA beneficia a produção agropecuária em pequenas propriedades rurais sem extinguir APP.
VERDADEIRO
Os artigos 61-A e 61-B instituíram na discussão e aprovação do Código Florestal a chamada “escadinha de recuperação” de áreas de preservação permanente, conferindo tratamento diferenciado a produtores rurais que tenham até 4 módulos fiscais de área na sua propriedade, e em algumas exceções até 10 módulos fiscais, diminuindo a área a ser recuperada e conciliando a produção de alimentos (atividades agrossilvipastoris) já consolidada, mas não extinguindo APP nestes espaços.
11) O Despacho 4.410/2020/MMA permite que sejam utilizadas formas diferenciadas de recuperação ambiental das APP, beneficiando pequenas propriedades rurais.
VERDADEIRO
O artigo 61-A prevê a possibilidade de utilização de técnicas antigas de recuperação ambiental como os sistemas agroflorestais (SAF), que conciliam produção agrícola e recuperação ambiental especialmente na conservação de solo. O artigo ainda permite plantio intercalado de espécies lenhosas, perenes ou de ciclo longo, e de espécies exóticas em até 50% em relação às nativas.
Fonte: MMA. Mitos e verdades sobre o despacho 4.410/2020/MMA, o Código Florestal e a Lei da Mata Atlântica.