Resumo Executivo – PL n° 929 de 2021
Autor: José Medeiros – PODE/MT | Apresentação: 16/03/2021 |
Ementa: Cria o Serviço Nacional de Apoio ao Agricultor Familiar – SENAF.
Orientação da FPA: Contrária ao projeto
Comissão | Parecer | FPA |
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AGRICULTURA, PECUÁRIA, ABASTECIMENTO E DES. RURAL (CAPADR) | – | – |
TRABALHO, ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇO PÚBLICO (CTASP) | – | – |
FINANÇAS E TRIBUTAÇÃO (CFT) | – | – |
CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA (CCJC) | – | – |
Principais pontos
- Cria o Serviço Nacional de Apoio ao Agricultor Familiar – SENAF.
- O SENAF será organizado e administrado pela Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (CONAFER) e dirigido por um colegiado.
- O PL 929/2021 diz que constitui renda do SENAF a “contribuição mensal compulsória, a ser recolhida à Previdência Social, de 0,5% sobre o salário mínimo vigente, das pessoas físicas registradas no Cadastro Nacional de Agricultura Familiar (Caf) […]”.
- A referida contribuição é instituída em substituição às contribuições, de mesma espécie, devidas e recolhidas pelos alcançados por essa Lei, e destinadas ao:
- Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI;
- Serviço Social da Indústria – SESI;
- Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC;
- Serviço Social do Comércio – SESC;
- Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte – SENAT;
- Serviço Social do Transporte – SEST;
- Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – SENAR;
- Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo – SESCOOP.
Justificativa
- O Senar já atende o público pretendido pelo Senaf. Na Lei 8.315/91 já consta a Formação Profissional Rural e Promoção Social do trabalhador rural, ou seja, abrange todo o público, inclusive o agricultor familiar.
- Importante relembrar que nessa questão que envolve atendimento aos agricultores familiares, também existe a atuação permanente das empresas estaduais de assistência técnica e extensão rural / ATER pública com 72 anos de atuação com capilaridade visando atendimento às famílias rurais e suas organizações constituídas, bem como, atuando na execução de políticas públicas.
- Sobre a representatividade da organização e administração pela Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (CONAFER), verificamos no Portal do Ministério da Justiça e Segurança Pública que não há registro sindical, ou seja, há vicio de formalidade para a criação do Senaf. (https://www.justica.gov.br/seus-direitos/registro/dados-abertos-estatistica).
- Aprofundando um pouco mais (dada a relevância da questão), a Constituição Federal do Brasil adota o princípio da unicidade sindical, segundo o qual é proibida a criação de mais de um sindicato na mesma base territorial. Esse princípio está expressamente previsto no art. 8º, II, do texto constitucional, segundo o qual:
Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:
(…)
II – é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;
- Como se vê, caso alguma categoria profissional ou econômica já tenha representação sindical em determinado território, a CF proíbe a criação de novo sindicato que abranja a mesma área.
- Ajustando a prescrição constitucional ao caso do PL 929/2021, é inevitável concluir que, no âmbito nacional, já existe a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA, que, de acordo com o Estatuto, “[…] é constituída pela categoria econômica dos ramos de agricultura, da pecuária, do extrativismo rural, da pesca, da silvicultura e da agro indústria […]” (art. 1º).
- Já o artigo 2º diz que a CNA “tem sede e foro na Capital Federal e jurisdição em todo território nacional”.
- Quanto aos objetivos, cabe à CNA “representar, organizar e fortalecer os produtores rurais brasileiros, defender seus direitos e interesses, promovendo o desenvolvimento econômico, social e ambiental do Setor Agropecuário”.
- Diante dessas transcrições, fica evidente que o produtor rural brasileiro já está representado pela CNA, a qual é a única confederação sindical que possui registro no Ministério do Trabalho, inclusive.
- Registre-se, por oportuno, o entendimento do STF segundo o qual “[…] 2. O registro sindical é o ato que habilita as entidades sindicais para a representação de determinada categoria, tendo em vista a necessidade de observância do postulado da unicidade sindical. 3. O postulado da unicidade sindical, devidamente previsto no art. 8º, II, da Constituição Federal, é a mais importante das limitações constitucionais à liberdade sindical […]” (Rcl 4990). O STJ, vale dizer, segue o mesmo entendimento, cf. AgREsp n.º 608.253/SP.
- Por conta disso, tem-se que a Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (CONAFER), ao qual o pretenso Serviço Nacional de Apoio ao Agricultor Familiar (SENAF) mencionado no PL 929/2021 quer se ver vinculado, não possui a representatividade constitucional adequada. A rigor, não pode ser considerada uma confederação sindical.
- Daí, considerando que a CONAFER, sob o ponto de vista constitucional, é uma entidade que não pode coexistir com a CNA (pois, como dito, a CF prescreve a unicidade sindical), o SENAF é, em verdade, um natimorto. Ou seja, aprovado o PL 929/2021, será “criada” uma entidade integrante do Sistema S que não poderá ser vinculada à Confederação que verdadeiramente representa a categoria dos produtores rurais (que é a CNA, e não a CONAFER). Até porque, é ao Senar (já criado pela Lei n.º 8.315 desde o ano de 1991) que cabe prestar a assistência ao produtor rural brasileiro (lembrando que a missão institucional do Senar é estruturada a partir de 3 eixos: a) formação profissional rural; b) promoção social; e c) assistência técnica e gerencial).
- Desse modo, criado o SENAF, será uma entidade a vagar disfuncionalmente pelo ordenamento jurídico brasileiro, pois, a um só tempo, (i) não poderá se vincular à CONAFER, já que essa “confederação” não possui a representatividade sindical adequada, e (ii) e não poderá se vincular à CNA, já que, essa posição já é “ocupada” legalmente pelo Senar desde 1991.
- Além disso, não faz sentido, sob o ponto de vista do princípio da eficiência, criar uma entidade (com todas as consequências que disso advém, tais como: investimento na estrutura física; quadro de pessoal; etc.) que tentará ocupar um espaço já preenchido há 30 anos, com absoluta excelência, pelo Senar. É absolutamente necessário dizer que soa até mesmo ilógico inserir mais uma organização no sistema sindical, sendo que mais de 75 milhões de produtores rurais brasileiros foram atendidos pelo Senar.
- Finalizando, há absoluta similitude entre as funções institucionais do Senar e a do pretenso SENAF. E há, também, integral coincidência entre os objetivos da CONAFER e os da CNA. Contudo, conforme demonstrado ao longo deste tópico, a CNA é a única confederação constitucionalmente legitimada a representar o produtor rural brasileiro e o Senar, desde 1991, é a entidade vinculada à CNA com função institucional de assistir o produtor rural .
- Além do Projeto de Lei dispor de recolhimento pela Previdência Social, entidade incompetente desde a edição da Lei nº 11.457/2007, verifica-se ilegalidade na principal fonte de receita. Considerando que as contribuições das entidades estão sujeitas às mesmas condições das contribuições previdenciárias, a principal fonte de receita do Senaf é inconstitucional.
- Em primeiro lugar, há diversas diferenças entre a “contribuição destinada às entidades integrantes do Sistema S” e a “contribuição a ser recolhida à Previdência Social”. Uma das principais diz respeito aos requisitos para a criação de cada tributo. Falando, sucintamente, das contribuições previdenciárias (que é a espécie referida no art. 3º, inciso I, do PL 929/2021, já que usa a expressão “recolhida à Previdência […]”), há condicionantes ainda mais rígidas. Para começar, a criação de nova fonte de custeio para a previdência social demandaria lei complementar (e não lei ordinária, tal como o PL 929/2021). Daí, se o SENAF quer entregar algum benefício previdenciário ao produtor rural cadastrado no Caf, deverá se sujeitar ao regime jurídico das contribuições previdenciárias (o que, s.m.j., não está atendido no PL 929/2021)
- Não obstante, as contribuições previdenciárias só podem ter alíquota ad valorem (tendo como base o faturamento, a receita bruta ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor aduaneiro) ou alíquota específica (tendo por base a unidade de medida adotada). Contudo, a “base de medida adotada” não pode ser o salário mínimo, pois, de acordo com o art. 7º, inciso IV, da CF, há expressão vedação à sua “vinculação para qualquer fim”. Em outras palavras, o salário mínimo não pode ser utilizado como indexador para nenhuma finalidade. Sobretudo em casos de tributos, pois, por exemplo, a cada vez que o salário fosse reajustado, haveria sem lei (já que o salário mínimo é reajustado todo ano por decreto) o aumento do valor devido a título de contribuição ao SENAF. Ou seja, haveria majoração de tributo sem lei, o que viola o princípio da legalidade tributária.
- Por fim, o artigo 195, § 8º da CF/88 prevê que o segurado especial contribui sobre o resultado da comercialização da produção e não sobre o “salário mínimo vigente”.
- Na justificação do projeto foi dito que “esse setor não tem a sua disposição uma rede de apoio e educação, como a que existe para a indústria, o comércio, as cooperativas e até mesmo para os grandes produtores rurais. Para a agricultura familiar falta crédito, assistência técnica, apoio à comercialização e o reconhecimento da sociedade”. Sem razão.
- O trabalho exercido pelas atuais entidades do Sistema “S”, principalmente do Senar é reconhecido pelo público rural e, inclusive, pelos parlamentares. Suprimir parte das rendas das entidades já existentes para revertê-la ao Senaf é um desserviço ao trabalhador rural.
- O Senar, por meio das 27 Administrações Regionais do Senar promove cursos e capacitações para desenvolver competências profissionais e sociais em aproximadamente 300 profissões do meio rural.
- O Senar ampliou, significativamente, as ofertas educativas de Formação Profissional Rural (FPR), Promoção social (PS) e educação profissional técnica e com a enorme capilaridade criou a metodologia de Assistência Técnica Gerencial (ATeG) com Meritocracia, que auxilia os produtores rurais das classes C, D e E que não têm acesso à assistência técnica e às novas tecnologias.
- É um retrocesso social atribuir ao Senaf, entidade nova, a competência de gerir um serviço ao público rural, quando já existe o Senar, instituição com quase 30 anos de história e com expertise para atender com eficiência o trabalhador rural.
- O Senar precisa continuar reafirmando seu protagonismo na melhoria da qualidade de vida da população rural, por meio de ações que contribuem para um cenário de crescente de desenvolvimento da produção sustentável, da competitividade e de avanços sociais no campo.