Resumo Executivo – PL n° 10782 de 2018
Autor: Erika Kokay (PT/DF) | Apresentação: 04/09/2018 |
Ementa: Altera o art. 1.048 do Código de Processo Civil para garantir prioridade na tramitação dos processos que envolvam a demarcação de terras indígenas e a titulação de propriedade a comunidades remanescentes de quilombos.
Orientação da FPA: Contrária ao projeto
Comissão | Parecer | FPA |
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Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) | 30/09/2019 – Parecer da Relatora, Dep. Joenia Wapichana (REDE-RR), pela aprovação. Inteiro teor | Contrária ao parecer da relatora |
Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) | – | – |
Principais pontos
- Prioriza a tramitação judicial dos processos de demarcação de terras indígenas e de titulação de propriedade a comunidades quilombolas.
- A proposta acrescenta a medida ao Código de Processo Civil (Lei 13.105/15).
Justificativa
- Estima-se que, quando da chegada dos Portugueses, havia de 1 a 3 milhões de indígenas em solo brasileiro. Nas primeiras décadas que se passaram, houve um drástico declínio populacional, continuando até meados de 1950, quando passou a aumentar, o que reflete, não só a conquista de direitos, mas também a presença de declarações fraudulentas, tendo em vista o critério da “autoatribuição”*, sem a devida verificação.
- *Pela legislação atual, para uma pessoa ser considerada indígena deve haver uma “autoatribuição”, ou seja, qualquer cidadão brasileiro que se sinta indígena pode-se “autoatribuir” como tal.
O Direito do Indígena à Terra (Indigenato)
- A interpretação equivocada e irrestrita que tem se dado ao indigenato, para além do equívoco legal, incorre em erro histórico, na medida em que desconsidera a formação do Estado e da nação, como se fosse possível corrigir dissensões pretéritas apagando-se por completo o presente.
- Guaranis, Tapajós, Terenas, Xavantes, Tucanos, Kaingangs, Pankararus, negros, brancos, amarelos e toda miscigenação decorrente: somos todos brasileiros.
- A extensão do conceito é apenas parte da estratégia política para estender o direito da “minoria” indígena, dando-lhe feição de nação e direitos originários pré-existentes ao próprio direito, afastando-se nossa soberania e incentivando conflitos entre o povo brasileiro (indígenas e não indígenas). Lamentavelmente, tal postura política foi adotada por ONGs, capitalizadas por Estados estrangeiros, permeadas em órgãos da Administração Pública e suportada por segmentos do Ministério Público Federal.
- O indigenato, portanto, nada mais é do que a posse de fato por comunidade indígena de determinada área, com os contornos do art. 231 da Constituição Federal, existente em 5 de outubro de 1988, não podendo ter o conceito alargado para justificar demarcação de área em que não havia posse contemporânea à promulgação da Carta Magna Brasileira. Para essas, se necessárias, outras políticas públicas, com a devida e justa indenização a quem de direito.
- A constituição determina que os indígenas têm o “direito originário” às terras por eles habitadas em caráter permanente, ou seja, a constituição foi clara em definir um marco temporal (1988) para distinguir os indígenas que têm direito a demarcação de suas terras. Dessa forma, o constituinte reconheceu que o processo de colonização brasileira se deu também em territórios que em 1988 não estavam mais ocupados por comunidades tradicionais, e que esses territórios não seriam aplicáveis para a teoria do “direito originário”.
- Caso essa interpretação da constituição não seja respeitada, todo o território brasileiro poderá ser considerado indígena, criando insegurança jurídica, a exemplo de Copacabana e Ipanema (que possuem nomes indígenas), serem reivindicadas como territórios indígenas.
- A constituição também determina que o direito à terra se dá para a manutenção dos seus usos, costumes e tradições, o que não acontece hoje em dia com grande parte dos indígenas, enfraquecendo o argumento do direito originário para os indígenas que já estão integrados.
As 19 Condicionantes
- A Constituição Federal de 1988 inovou consagrando um capítulo ao direito dos povos indígenas, regulando desde preceitos básicos, como também o direito originário, a demarcação e os procedimentos de ordem econômica e de interesse público que somente o Congresso Nacional pode autorizar nessas terras.
- O prazo para demarcar as terras indígenas foi estabelecido desde 1973 no Estatuto do índio, e, reafirmado em 1988 no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, estabelecendo que as terras indígenas devessem ser demarcadas no prazo de 5 (cinco) anos. O procedimento administrativo da demarcação de terras foi regulado pela primeira vez por Decreto em 1976 e é regulamentado atualmente por Decreto de nº. 1.775/96.
- Apesar do Supremo Tribunal Federal (STF) ter estabelecido conceitos inequívocos sobre procedimento de demarcação de terra indígena (marco temporal de 05.10.1988 e as condicionantes), quando do julgamento da PET 3388 (Raposa Serra do Sol), temos observado que o Ministério Público Federal tenta incessantemente relativizar o marco temporal de 05/10/1988, sob o argumento de que os índios não estavam ocupando suas terras na data da promulgação da Constituição por terem sido expulsos no passado remoto.
- No julgamento foram firmadas 19 condicionantes e reconhecido o marco temporal de ocupação para reconhecimento de terras tradicionalmente ocupadas por indígenas, qual seja, promulgação da Carta da República (05/10/1988).
- o usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos existentes nas terras indígenas (art. 231, § 2º, da Constituição Federal) pode ser relativizado sempre que houver, como dispõe o art. 231, § 6º, da Constituição, relevante interesse público da União, na forma de lei complementar;
- o usufruto dos índios não abrange o aproveitamento de recursos hídricos e potenciais energéticos, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional;
- o usufruto dos índios não abrange a pesquisa e lavra das riquezas minerais, que dependerá sempre de autorização do Congresso Nacional, assegurando-lhes a participação nos resultados da lavra, na forma da lei;
- usufruto dos índios não abrange a garimpagem nem a faiscação, devendo, se for o caso, ser obtida a permissão de lavra garimpeira;
- o usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse da política de defesa nacional; a instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico, a critério dos órgãos competentes (Ministério da Defesa e Conselho de Defesa Nacional), serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI;
- a atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal na área indígena, no âmbito de suas atribuições, fica assegurada e se dará independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI;
- o usufruto dos índios não impede a instalação, pela União Federal, de equipamentos públicos, redes de comunicação, estradas e vias de transporte, além das construções necessárias à prestação de serviços públicos pela União, especialmente os de saúde e educação;
- o usufruto dos índios na área afetada por unidades de conservação fica sob a responsabilidade do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade;
- o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade responderá pela administração da área da unidade de conservação também afetada pela terra indígena com a participação das comunidades indígenas, que deverão ser ouvidas, levando-se em conta os usos, tradições e costumes dos indígenas, podendo para tanto contar com a consultoria da FUNAI;
- o trânsito de visitantes e pesquisadores não-índios deve ser admitido na área afetada à unidade de conservação nos horários e condições estipulados pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade;
- devem ser admitidos o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios no restante da área da terra indígena, observadas as condições estabelecidas pela FUNAI;
- o ingresso, o trânsito e a permanência de não-índios não pode ser objeto de cobrança de quaisquer tarifas ou quantias de qualquer natureza por parte das comunidades indígenas;
- a cobrança de tarifas ou quantias de qualquer natureza também não poderá incidir ou ser exigida em troca da utilização das estradas, equipamentos públicos, linhas de transmissão de energia ou de quaisquer outros equipamentos e instalações colocadas a serviço do público, tenham sido excluídos expressamente da homologação, ou não;
- as terras indígenas não poderão ser objeto de arrendamento ou de qualquer ato ou negócio jurídico que restrinja o pleno exercício do usufruto e da posse direta pela comunidade indígena ou pelos índios (art. 231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, caput, Lei n° 6.001/1973);
- é vedada, nas terras indígenas, a qualquer pessoa estranha aos grupos tribais ou comunidades indígenas, a prática de caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de atividade agropecuária ou extrativa (art. 231, § 2º, Constituição Federal, c/c art. 18, § 1º, Lei nº 6.001/1973);
- as terras sob ocupação e posse dos grupos e das comunidades indígenas, o usufruto exclusivo das riquezas naturais e das utilidades existentes nas terras ocupadas, observado o disposto nos arts. 49, XVI, e 231, § 3°, da CR/88, bem como a renda indígena (art. 43 da Lei nº 6.001/1973), gozam de plena imunidade tributária, não cabendo a cobrança de quaisquer impostos, taxas ou contribuições sobre uns ou outros;
- é vedada a ampliação da terra indígena já demarcada;
- os direitos dos índios relacionados às suas terras são imprescritíveis e estas são inalienáveis e indisponíveis (art. 231, § 4º, CR/88); e
- é assegurada a participação dos entes federados no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas, encravadas em seus territórios, observada a fase em que se encontrar o procedimento.
- Dessa maneira, o projeto mostra-se não meritório pois não considera o entendimento do STF com relação às 19 condicionantes para demarcação de terras indígenas, e busca, tão somente, acelerar o processo de demarcação desconsiderando todo o complexo trâmite envolvido.